Pesquisadores do ambulatório de oftalmologia do Hospital de Clínicas (HC) da Unicamp avaliaram o impacto da pandemia no acompanhamento dos pacientes com glaucoma atendidos no hospital. Para isso, comparam o número total de consultas clínicas ambulatoriais, exames de campo visual, procedimentos cirúrgicos e medicamentos liberados no período de pré-pandemia de covid-19, de março de 2019 a fevereiro de 2020 ao período da pandemia, de março de 2020 até fevereiro de 2021. Todos os dados foram obtidos dos prontuários eletrônicos do HC da Unicamp.
A pesquisa deu origem ao artigo O impacto da Covid-19 no acompanhamento de pacientes com glaucoma em um centro terciário: uma comparação entre os períodos pré-pandêmico e pandêmico publicado no periódico Clinical Ophthalmology. De acordo com Gabriel Ayub, José Paulo Cabral de Vasconcelos e Vital Paulino, oftalmologistas do HC Unicamp, esse é o primeiro estudo no Brasil que mediu impacto da covid-19 nos atendimentos clínicos de uma doença crônica.
“A pandemia de covid-19 diminuiu drasticamente o número de consultas ambulatoriais e procedimentos cirúrgicos, impactando o acompanhamento de pacientes com glaucoma no HC. Nossa expectativa é de uma possível sobrecarga de pacientes com glaucoma não controlado no futuro”, alertam Gabriel Ayub, José Paulo Cabral de Vasconcelos e Vital Paulino Costa.
Durante o período pré-pandêmico, os pesquisadores observaram um total de 7.170 visitas clínicas (3.965 pacientes), 1.525 exames de campo visual (1.410 pacientes), 682 procedimentos cirúrgicos de glaucoma (466 pacientes) e 23.259 medicamentos liberados (813 pacientes). Já no período do surto de covid-19, eles observaram 532 visitas clínicas (514 pacientes), 94 exames de campo visual (94 pacientes), 145 procedimentos cirúrgicos de glaucoma (127 pacientes) e 18.692 medicamentos liberados (616 pacientes).
Estes números representam uma redução de 92,52% nas consultas clínicas ambulatoriais, 93,84% nos exames de campo visual, 72,74% nos procedimentos cirúrgicos e 19,63% nos medicamentos liberados.
“São números bastante expressivos, mas o ponto positivo encontrado em nossa pesquisa é o menor impacto da pandemia no fornecimento de medicação de alto custo. Cerca de 80% dos pacientes tiveram acesso ao tratamento clínico no período, o que pode ter evitado desfechos mais graves durante esse ano”, diz Ayub.
“Embora não tenhamos medido as reais consequências dessa redução no controle do glaucoma, é provável que o acompanhamento inadequado durante este período favoreceu a ocorrência de progressão da doença, particularmente em pacientes com glaucoma avançado, que são mais sensíveis às variações da pressão intraocular não controlada”, comenta o oftalmologista Vital Paulino Costa, orientador da pesquisa.
Glaucoma e covid-19
O glaucoma é a principal causa de cegueira irreversível no mundo, afetando mais de 76 milhões de pessoas em 2020 e mais 40 milhões nos próximos anos. No Brasil, estima-se que 3,1% da população seja afetada pela doença. O diagnóstico e o tratamento de pacientes com glaucoma são totalmente cobertos pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
O HC da Unicamp é referência em 42 municípios e presta atendimento pelo Sistema Único de Saúde (SUS) para uma população estimada em 3,2 milhões de pessoas. O ambulatório de Oftalmologia é responsável por todas as consultas clínicas e exames de campo visual, o centro cirúrgico ambulatorial por todos os procedimentos cirúrgicos e a Farmácia de Alto Custo pela liberação de medicamentos para o tratamento de glaucoma.
Durante a pandemia, o HC da Unicamp suspendeu todas as cirurgias eletivas a fim de concentrar recursos humanos e econômicos no cuidado de pacientes com covid-19. O ambulatório de oftalmologia adiou as cirurgias e atendimentos não urgentes, conforme recomendado por diferentes sociedades de oftalmologia.
José Paulo Cabral de Vasconcelos. Foto: Julia Moretzsohn – Assessoria de imprensa HC Unicamp
“Nosso estudo irá nortear o planejamento do retorno dos atendimentos no HC, além de servir de base, igualmente, para outras unidades de saúde que foram impactadas pela pandemia”, explica o oftalmologista José Paulo Cabral de Vasconcelos.
Atendimentos
Com a redução dos casos de covid-19, o HC Unicamp está retomando suas atividades de atendimento de pacientes eletivos. A Coordenação de Assistência (COAS) do HC liberou 20% dos atendimentos agendados no ambulatório de oftalmologia e as cirurgias voltaram ao normal.
“A retomada gradual dos atendimentos faz parte do planejamento do HC no enfrentamento da pandemia. Estamos prevendo que até março de 2022 estaremos com 100% dos atendimentos liberados”, explica Elaine Cristina de Ataíde, coordenadora de assistência do HC.