Conteúdo principal Menu principal Rodapé

A medida ultrassonográfica da soma da espessura das camadas íntima e média das artérias carótidas, localizadas no pescoço e que levam o sangue para o cérebro, foi uma importante técnica utilizada, durante muito tempo, pelos cardiologistas para a avaliação não invasiva da aterosclerose. De 2019 para cá, seguindo as diretrizes europeias, os médicos abandonaram esse exame simples e barato para o diagnóstico precoce da doença e passaram a adotar a tomografia das coronárias – que exige contraste e não é oferecido pelo Sistema Único de Saúde (SUS) – para identificar as placas de gordura que se formam nas coronárias e que podem levar ao infarto.

Na contramão dessa tendência, um grupo de pesquisadores da área de cardiologia do Hospital de Clínicas (HC) e da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp insistiu em pesquisar mais a fundo a relação entre a espessura da camada íntima da carótida e o risco em ter aterosclerose e infarto do miocárdio.

Os resultados estão no artigo A espessura da camada íntima da carótida, mas não a espessura da média-intimal, está relacionada à calcificação da artéria coronária em indivíduos com diabetes tipo 2: resultados do Estudo Brasileiro de Diabetes, aceito para publicação na revista Nutrition, Metabolism and Cardiovascular Diseases, do grupo Nature.

A aterosclerose é uma inflamação com a formação de placas de gordura, cálcio e outros elementos na parede das artérias do coração e de outros pontos do corpo humano, como por exemplo cérebro, membros inferiores etc., de forma difusa ou localizada. Segundo o coordenador do serviço de ecocardiografia do HC, José Roberto Matos Souza, um dos autores do artigo, a aterosclerose é uma doença silenciosa que pode levar a infartos, derrames e morte súbita.

“Essa é uma doença de evolução lenta que costuma apresentar sintomas só em estágio avançado, o que pode ocorrer já em situação de emergência. Com novas formas para o diagnóstico precoce, poderemos salvar muitas vidas”, explica Souza.

Os especialistas da Unicamp já sabiam que a soma da espessura da camada íntima e da média – chamada de espessura média-intimal – era inconsistente para a previsão do risco cardiovascular e que o ultrassom tradicional não tinha a capacidade de identificar apenas o que estava acontecendo na camada íntima da carótida.

“A camada íntima é o local onde o colesterol LDL vai se acumulando e formando a placa de gordura que leva à aterosclerose. Com o tempo, isso causa o entupimento das coronárias”, explica o médico cardiologista Andrei Sposito, orientador do estudo.

Os pesquisadores da Unicamp notaram a formação de placas de gordura nas carótidas de pacientes com diabetes tipo 2 selecionados para o estudo. Com a ajuda de um software desenvolvido por Rangel Arthur, da Faculdade de Tecnologia (FT) da Unicamp, e Alexandre Gonçalves da Silva, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), os pesquisadores conseguiram definir um padrão para avaliar o risco cardiovascular e confirmar a hipótese da pesquisa.

“Nosso estudo mostra, pela primeira vez em indivíduos com diabetes tipo 2, que a placa de gordura formada na espessura íntima da coronária está fortemente associada à aterosclerose. Esse resultado abre caminho para a possibilidade de identificar a aterosclerose subclínica e intensificar as medidas de prevenção em indivíduos com DM2 [diabetes mellitus tipo 2] como um método seguro e acessível”, diz Sposito.

Inteligência artificial

Da esq. para a dir., os médicos e docentes Andrei Sposito, José Roberto Matos Souza e Wilson Nadruz Júnior

O software desenvolvido na Unicamp usa inteligência artificial para diagnosticar o risco de doenças do coração. Para conseguir identificar as alterações na espessura da camada íntima da carótida analisando as imagens comuns de ultrassom, os pesquisadores da área de cardiologia do HC associaram esse software à ultrassonografia dos 224 pacientes com diabetes tipo 2 que participaram do estudo.

As imagens extraídas de ultrassons foram pré-processadas para eliminar ruídos e reduzir a diferença de intensidade gerada pela assimetria de iluminação. Na sequência, aplicou-se um filtro, denominado vertical, usado para destacar regiões de interesse.

As análises dos dados foram feitas por Nestor Martins, principal autor do artigo, com a colaboração dos pesquisadores Joaquim Barreto, Sheila Tatsumi Kimura Medorima, Sofia Helena Vitte, Thiago Quinaglia e Bárbara Assato, todos integrantes do Laboratório Aterolab, da FCM.

“Acreditamos que essa tecnologia terá um enorme potencial na prevenção cardiovascular, no tratamento precoce e na redução do número de doenças cardiovasculares futuras”, diz o cardiologista e professor da FCM, Wilson Nadruz Júnior, outro coautor da pesquisa, juntamente com o cardiologista e docente da FCM Otavio Rizzi Coelho Filho.

O software teve o depósito de patente realizado junto ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi) e está disponível para ser licenciado junto à Agência de Inovação Inova Unicamp.


Matéria originalmente publica por Edimilson Montalti no Jornal da Unicamp
Fotografia: Antonio Scarpinetti – SEC Unicamp

Ir para o topo