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Presbifonia é o nome que se dá ao processo de envelhecimento da voz. Como todas as funções do organismo, a voz também envelhece, com perda de força, velocidade, estabilidade e precisão articulatória. Ocorre atrofia e arqueamento das pregas vocais e a musculatura da laringe fica mais flácida, o que torna a voz trêmula, rouca, soprosa, com pouca projeção. Este processo pode começar já a partir dos 50 ou 55 anos de idade, acentuando-se mais à frente, dependendo do histórico de vida do indivíduo.

“É comum a pessoa na terceira idade apresentar uma deficiência auditiva associada à dificuldade de falar. Por conta dessas limitações, vemos sérios problemas de comunicação entre marido e mulher nessa faixa etária – e deles com a sociedade. Entretanto, as mudanças na voz não são exclusivas do envelhecimento: certas doenças neurológicas, como o mal de Parkinson, também levam à degeneração da qualidade vocal”, observa o professor Agrício Crespo, chefe da Disciplina de Otorrinolaringologia da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp.

Segundo Agrício Crespo, o que muitos ainda ignoram é que existem recursos técnicos para recuperar a qualidade e a vitalidade davoz dos idosos, potencializando seus timbres sonoros. “O paciente procura o médico quando está ouvindo mal, mas não quando está falando mal; julga que o problema com a voz é normal e irremediável na velhice. A própria classe médica não está tão consciente de que a voz também pode ser melhorada. O médico, que examina o aparelho auditivo do paciente, raramente atenta para a fonação”.

A fonoterapia é um dos recursos contra a presbifonia utilizados no Ambulatório de Otorrinolaringologia do Hospital das Clínicas (HC) da Unicamp, através de um método de exercícios desenvolvido originalmente para tratamento de pacientes com Parkinson. “Os exercícios trabalham a coordenação motora da boca e da laringe, numa calibração sensorial para aumentar a velocidade, a altura e a força de projeção da voz. É como se o idoso passasse por uma reprogramação, reaprendendo a se comunicar em outro patamar”.

O professor da FCM explica que este tratamento dura quatro semanas, com exercícios de repetição diários e intensivos, e vem trazendo resultados altamente satisfatórios. A propósito, ele mostrou a gravação do cantarolar de uma octogenária – cujo maior entretenimento é atuar no coral da igreja – antes e depois do tratamento. “É impressionante a melhora no volume e estabilidade da voz, na velocidade da fala e na precisão da articulação. Conseqüentemente, há uma melhora também nas condições gerais e na autoestima do paciente”.

Outro tipo de tratamento é voltado para casos mais severos, com atrofia das cordas vocais – uma perda da massa muscular importante, como acontece nos músculos de braços e pernas. “Trata-se de injetar na corda vocal substâncias presentes no organismo do próprio paciente, a exemplo da gordura do abdômen, ou do ácido hialurônico que existe para preencher o espaço entre as células. Estas substâncias de enchimento, usadas inclusive em cirurgias plásticas, aumentam o volume e a elasticidade da corda vocal, o que resulta no rejuvenescimento da voz”.

Agrício Crespo assegura que os efeitos benéficos são duradouros, tanto da fonoterapia como da injeção de substâncias de enchimento. “Por vezes, convém inclusive associar os dois tratamentos. Para um resultado duradouro, o paciente deve apenas se submeter a uma manutenção anual, principalmente de fonoterapia. O idoso que busca a academia vê diminuir a flacidez muscular, mas precisa seguir nos exercícios para manter seu corpo. Em relação à voz, nem se exige tanta disciplina”.

Um aspecto interessante da presbifonia, como observa o médico, é o fato de que a degeneração começa antes nas mulheres, mas acaba se tornando mais intensa nos homens – que por isso são as maiores vítimas de atrofia nas cordas vocais. “Na terceira idade, a voz do homem vai ficando cada vez mais aguda e frágil, enquanto a da mulher vai se tornando mais grave. Suas vozes se tornam parecidas, como nos primeiros anos de vida, quando é difícil distinguir as vozes de um menino e de uma menina”.

O professor da Unicamp recomenda a ida ao otorrinolaringologista quando o idoso se cansa ao falar e os interlocutores não o compreendem por causa da voz fraca, rouca e sem projeção. “É fato que o envelhecimento da voz faz parte da vida, mas isto pode ser melhorado. Por isso, é importante prestar atenção nos sinais de degeneração e procurar o especialista para uma laringoscopia – exame que não é invasivo nem doloroso. Através de lentes, o médico vai observar as cordas vocais em funcionamento e indicar a melhor forma de tratamento”.

Novo hábito

Na opinião de Agrício Crespo, faz poucos anos que o Brasil começou a se preocupar com a qualidade de vida na terceira idade e, por isso, ainda não adquiriu o hábito de cuidar da voz. “Quando éramos crianças, olhávamos um homem de 50 anos como a um idoso; hoje, ninguém se sente velho mesmo aos 60. As pessoas da terceira idade agora se preocupam com o corpo e a alimentação e vão ao médico não mais porque estão doentes, mas para evitar doenças e preservar a saúde. O cuidado com a voz precisa fazer parte deste conjunto de precauções”.

A procura por tratamento para a presbifonia no HC é muito pequena, aumentando apenas na Campanha Nacional da Voz – campanha de prevenção contra o câncer de laringe e outros males ligados à voz, que Crespo coordena na Região Metropolitana de Campinas (veja texto nesta página). “Geralmente, recebemos apenas pacientes com problemas severos, como de perda da voz devido a um tumor. A procura é reduzida também nos consultórios, já que as pessoas desconhecem a existência dessas técnicas de rejuvenescimento vocal”.

Daí, a preocupação do professor da Unicamp em difundir este conhecimento tanto entre leigos como na área médica, no intuito de agregar qualidade de vida aos idosos. “O neurologista que trata dos tremores de um paciente com Parkinson, comumente ignora a degeneração da voz, como se esta fosse uma situação imutável. Por vezes, a presbifonia é o que mais impacta no dia-a-dia do paciente, visto que sua capacidade de comunicação está prejudicada”.

Como forma de ressaltar a importância de informar os leigos da terceira idade sobre a disponibilidade de tratamento para o envelhecimento da voz, o médico recorre à imagem das mulheres que buscam prolongar a juventude com cirurgias plásticas para eliminar as rugas e dietas e medicamentos para conservar um corpo saudável. “A degeneração da voz contrasta com a aparência cuidada e acaba denunciando a idade delas”.

Em termos de prevenção, Agrício Crespo considera que a participação em corais ou aulas de canto, ou mesmo o hábito de falar muito, contribuem para manter a saúde da voz. “Em Campinas, a cantora lírica Niza de Castro Tank sustenta sua bela voz mesmo depois dos 70 anos, graças aos ensaios diários e uma vida de dedicação ao canto. Como alguém que praticou esportes a vida toda, ela chega à terceira idade com a voz em condições bastante superiores. Entretanto, se a degeneração vocal é grande, os métodos que propomos fazem a diferença”.

Luiz Sugimoto
Assessoria de Imprensa da Unicamp

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