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Um projeto sobre saúde mental e cidadania, liderado pela Unicamp, foi um dos quatro selecionados entre 120 concorrentes internacionais para receber investimentos de US$ 1 milhão nos próximos cinco anos, vindos do International Development Research Center (IDRC), agência federal de fomento do Canadá. O lançamento da Aliança de Pesquisa entre Universidade e Comunidade (Aruc, sigla formada em francês) ocorreu nesta quarta-feira (28) com um seminário internacional que está ocupando por dois dias o auditório da Faculdade de Ciências Médicas (FCM).

A Aruc consolida uma aliança entre universidades e entidades comunitárias com o objetivo de desenvolver pesquisas que levem em conta o ponto de vista das pessoas com problemas de saúde mental. Os recursos de US$ 200 mil por ano serão destinados a pesquisas já em andamento e às futuras, bolsas de pós-graduação e intercâmbio de docentes e pós-graduandos entre a Unicamp e a Universidade de Montreal, com a transferência do conhecimento para os serviços de saúde e a comunidade.

O projeto é coordenado pela professora Rosana Onocko Campos, do Departamento de Medicina Preventiva e Social da FCM, e tem a parceria das universidades federais Fluminense (UFF) e do Rio de Janeiro (UFRJ), Rio Grande do Sul (UFRGS) e Bahia (UFBA). “É um projeto multicêntrico envolvendo cerca de 30 pesquisadores, além dos parceiros comunitários. É um dia feliz a ser comemorado com todos os colaboradores que estão ampliando o trabalho para vários pontos do país. O financiamento permitirá multiplicar a transferência tecnológica”.

Segundo Rosana Onocko, no seminário estão sendo apresentadas pesquisas em desenvolvimento (no caso, com verbas do CNPq e da Fapesp) e as estratégias para a Aruc. “Esta aliança visa a uma pesquisa mais engajada, que pretende trazer ao primeiro plano a voz, as necessidades e as reivindicações de quem possui problemas de saúde mental. Falamos de pessoas com transtornos graves e persistentes, que enfrentam sérias dificuldades no dia a dia e que precisam de políticas públicas para continuar vivendo em comunidade, sem que se repita o circuito de exclusão de antigamente: as internações”.

A coordenadora informa que os pesquisadores, atualmente, trabalham com três eixos, o primeiro deles sobre a gestão autônoma da medicação. “Vamos distribuir uma cartilha para orientar equipes de saúde mental e também os pacientes, já que muitos tomam medicamentos de longo prazo e que provocam efeitos colaterais. É uma adaptação de um material canadense que estamos trazendo para o Brasil”.

O segundo eixo, segundo a docente da Unicamp, é o estudo em primeira pessoa das experiências daqueles que sofrem de esquizofrenia, buscando construir, junto com psiquiatras e pacientes, novos parâmetros e inclusive diagnósticos para a doença. “O objetivo é trazer as sensações e vivências das pessoas que sofrem de problemas mentais até o centro do atendimento médico”.

Rosana Onocko acrescenta como terceiro eixo a retomada de um projeto desenvolvido há alguns anos, com financiamento do CNPq, em torno de indicadores de avaliação dos serviços em saúde mental, notadamente nos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS). “Fizemos o estudo em Campinas e agora pleiteamos a sua ampliação para todo o Estado de São Paulo, junto à Fapesp”.

Universidade e sociedade
O reitor Fernando Costa, que presidiu a cerimônia de abertura do seminário internacional, observou que o tema “saúde mental e cidadania” traz embutidos os três fundamentos que norteiam uma universidade como a Unicamp, que tem como missão o ensino, a pesquisa e a extensão. “A escolha deste projeto entre mais de cem concorrentes demonstra a sua qualidade, as boas perspectivas de investigação e de interação com a comunidade, e a qualidade dos docentes e pesquisadores”.

David O’Brian, representante do IDRC, afirmou que o projeto brasileiro foi escolhido por combinar a perspectiva da ciência social e saúde pública. “Em 2007, adotamos um novo modo modelo juntamente com o conselho que financia pesquisas em ciências sociais no Canadá, criando a Aruc. É um programa desafiador, pois buscamos desenvolver pesquisas, mas com o envolvimento da comunidade. A forma de procurar parcerias internacionais foi através desta competição global. Vocês devem se sentir orgulhosos”.

Na opinião de Karime Porto, da Coordenação de Saúde Mental do Ministério da Saúde, o projeto Aruc é fundamental por aproximar a universidade, os profissionais da área, a comunidade e a gestão. “Com a triplicação dos serviços em saúde mental de base comunitária nos últimos dez anos, temos agora novos desafios. Um dos maiores é fortalecer os dispositivos de articulação entre a gestão e os profissionais para dar protagonismo aos usuários e familiares como parceiros no tratamento”.

Os usuários dos serviços também se fizeram representar no seminário, com Nilson de Sousa, presidente da Aflore – Associação de Familiares e Amigos da Saúde Mental de Campinas. “Nossa associação nasceu por causa da falta de espaço para discutirmos os problemas do dia a dia. Hoje é uma pessoa jurídica que pensa não só na nossa saúde, mas educação, trabalho, cultura, esportes, em nós como cidadãos no seu todo. Precisamos de mais do que remédios. Quem mais sabe da nossa doença, somos nós. Por isso, é um momento histórico estar junto com as universidades”.

Na abertura do encontro, a professora Rosana Onocko mostrou-se esperançosa de que a Aruc contribua para vencer o estigma que a doença mental ainda acarreta na sociedade. “Como sanitarista, lembro uma aliança histórica entre usuários e pesquisadores que permitiu reverter o rumo da epidemia de Aids no mundo. Sou otimista e sonho que possamos ter a definição de políticas públicas, protocolos e incorporação tecnológica também em relação à saúde mental”.

Hélio Costa Júnior (texto), Antonio Scarpinetti (fotos) e Everaldo Silva (edição de imagens)
ASCOM / Unicamp

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