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Cerca de 150 médicos infectologistas do interior do Estado de São Paulo reuniram-se nesta sexta-feira (21/06), no auditório da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp, para participar do Encontro de Infectologia do Interior Paulista, conhecido como Caipirão. O evento foi promovido pela Sociedade Paulista de Infectologia e reuniu especialistas que debateram e assistiram diversas palestras na área de resistência bacteriana, diagnóstico e tratamento de infecções fúngicas, hepatites virais, infecções comunitárias e HIV. O infectologista Luis Gustavo Oliveira Cardoso, coordenador CCIH do HC, ajudou na coordenação.

A abertura do evento foi realizada pela chefe da disciplina de infectologia da FCM da Unicamp, Maria Luiza Moretti (foto) e pelo presidente da Sociedade Paulista de Infectologia, Mauro Salles da Santa Casa de São Paulo. A última edição Caipirão aconteceu há oito anos, em Ribeirão Preto. “Os primeiros encontros aconteceram no início da década de 90, sempre no interior do Estado de São Paulo. Esses encontros são proveitosos para a atualização de conhecimentos, troca de informações, divulgação de novas pesquisas e também para rever amigos de outras Universidades”, destacou Moretti.

No primeiro bloco de palestras foram tratados três temas relativos à resistência bacteriana na prática clínica. O Staphylococcus aureus resistente à meticilina (MRSA) abriu o evento em aula ministrada pelo professor Gilberto Gambero da USP. Ele destacou que a resistência à vancomicina é um problema crescente, particularmente em UTIS (neonatal, pediátrica e adulto), e mesmo sendo uma droga com nefrotoxidade alta ainda deve ser empregada para bacteremia e peneumonia. “Com a vancomicina é importante trabalhar a dose pelo peso com uma especial preocupação beira leito para pacientes com IMC acima de 40”, enfatizou Gambero.

O problema global de resistência antimicróbica crescente retomou o interesse no emprego das polimixinas B e E – também conhecidas como colistinas – que foi muito utilizada até os anos 70. O professor Carlos Magno Fortaleza, da Unesp-Botucatu, falou sobre o uso da droga no combate ao Acinetobacter e a KPC, que era muito mais tóxica do que a usada até os anos 70. “A eficácia parece maior com a combinação com os carbapenêmicos”, comentou. Christian Hofling da Unicamp encerrou o bloco falando sobre infecções do trato urinário (ITU), em especial a bactéria Escherichia coli.

A segunda parte dos debates da manhã tratou sobre o diagnóstico e o tratamento de infecções fúngicas invasivas. O médico do HC, Luis Felipe Bachur, falou sobre doenças oportunistas em pacientes imunosuprimidos (sistema imunológico praticamente desativado e vulnerável a infecções) e neutropênicos – disfunção do sangue caracterizada por uma contagem anormal de neutrófilos, a célula branca mais importante no sangue. Já o infectologista Ricardo Cavalcanti (Unesp – Botucatu) enfatizou os novos antifúngicos – fluconazol, anfotericina B e equinocandina que trouxeram ganhos de eficácia, espectro e redução de efeitos colaterais.

As hepatites virais encerraram as discussões da manhã. O infectologista da FMRP, Rodrigo de Carvalho Santana, explicou sobre os inibidores de protease no tratamento da Hepatite C e o uso da terapia tripla (telaprevir ou boceprevir em combinação com PEG-interferon e rivabirina) que começará a ser aplicada em pacientes do SUS a partir deste mês. A taxa de cura chega a 75% e o tempo de tratamento que era de 48 semanas cai para 24. Sobre hepatite B a professora Maria Helena Pavan da FCM da Unicamp, abordou a recidiva da doença em pacientes com transplantes de rins e o emprego da droga rituximabe.

A especialista em infecção em transplante e docente da FCM, Raquel Silveira Stucchi, apresentou um estudo de casos sobre pacientes cirróticos com escala MELD (Modelo para Doença Hepática Terminal). O MELD começou a ser empregado pelos médicos em 1964. Em 1973 sofreu uma modificação válida até hoje. A infectologista frisou que os exames de ultrassonografia são mais vantajosos para avaliar a gravidade de hepatocarninomas em relação à tomografia sem contraste, que apresenta um alto índice de falso-positivo.

O período da tarde iniciou os debates com o tema infecções comunitárias, que teve a moderação do professor Franscisco Aoki. O registro de febre amarela silvestre – por epizootia – no Estado de São Paulo depois de 56 anos, e as mortes ocasionadas pela doença foi o tema da primeira palestra. Quem trouxe o caso foi o docente Ricardo Almeida, do Departamento de Doenças Tropicais da Unesp-Botucatu que detalhou como foi a criação de um comitê emergencial para gestão da crise de vacinação em uma região com mais de 80 municípios. Ao todo foram 83 casos – 28 confirmados e 11 óbitos – em decorrência do vírus da febre amarela silvestre.

A cobertura de patógenos atípicos em Pneumonia Adquirida na Comunidade (PAC) foi relatada pela pesquisadora Lucieni de Oliveira Conterno da FANEMA. PAC é aquela que acomete o paciente fora do ambiente hospitalar ou que surge nas primeiras 48 horas de internação. Entre os patógenos citados na aula estão a legionella, clamídea e a Chlamydophila.

O professor da USP Ribeirão Preto, Benedito Fonseca, deu continuidade ao bloco de infecções comunitárias falando sobre perspectivas futuras para vacinas da dengue. Fonseca trabalha há mais de 15 anos no desenvolvimento da vacina contra os quatro sorotipos de dengue. Segundo ele cerca de 3 bilhões de pessoas no mundo correm risco de contrair a doença, 100 milhões já tiveram dengue e 1 milhão já morreram em decorrência da forma mais grave, a hemorrágica. ” A vacina terá que ser tetravalente com três doses e uma taxa acima de 95 por cento”, detalha Fonseca que acrescenta “Talvez não atinjamos esse níveis altos de eficácia em função dos genótipos diferentes”.

O presidente da Sociedade Paulista de Infectologia, Mauro Salles, fez uma aula relatando suas pesquisas na Santa Casa de São Paulo em infecções associadas a biofilmes. Um dos casos apresentados, foi de uma paciente do Maranhão que relatava dores constantes em um joelho com muitos episódios de febre, após uma cirurgia por artroscopia, onde os médicos não conseguiam identificar o agente da infecção. Após inúmeras investigações a paciente chegou a São Paulo, onde se verificou um caso raro de infecção por uma alga conhecida como Prototheca wickerhamii. “Era uma infecção crônica típica de biofilme que não poderia ser tratada com uma única droga”, conclui Salles.

As pesquisas sobre HIV fecharam o evento. A perspectiva da cura da AIDS foi o tema da aula da professora Maria Cecília Cervi da da USP Ribeirão Preto. Segundo ela, no mundo somente 30% dos portadores são tratados e uma das pesquisas em andamento é copiar a resistência natural do polimorfismo receptor CCR5. O HIV utiliza a CCR5 ou CXCR4 como co-receptor para entrar na célula. “Um dos focos mundiais da investigação dos cientistas é o paciente Berlin, de 40 anos, que está curado”, disse Cervi.

Outro exemplo relatado foi o da pesquisadora norte-americana Debora Persand, da The Johns Hopkins University. Ela foi responsável pelo relato do primeiro caso mundial de cura funcional em uma criança HIV. Prematura, a criança recebeu uma profilaxia tripla por 18 meses onde a carga viral ficou indefinível por vários exames, mesmo com uma detecção viral pequena. “Mesmo assim o caminho ainda é longo”, sentenciou Cervi. Outra pesquisadora da área, Mônica Jacques de Moraes tratou dos principais reservatórios virais (células CD4 de memória) presentes no tecido linfóide associado ao trato gastrointestinal (GALT), no sistema de trato gineco-urinário e sistema nervoso central. “Descobertas recentes revelaram que esses reservatórios são de 10 a 100 vezes maiores do que se acreditava”, esclareceu a médica da Unicamp. O evento foi concluído com palestra de Alexandre Barbosa, da Unesp-Botucatu, que falou sobre profilaxia de HIV em casais discordantes.

Caius Lucilius – Assessoria de Imprensa HC

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