Seu uso é diário e poucos se aventuram a não utilizar o antitranspirante num país tropical como o Brasil. Mas recentemente esse recurso tem sido, talvez precipitadamente, associado ao aparecimento do câncer de mama. Existe a hipótese de que o efeito do alumínio em células humanas possa ter implicações na sua origem. O alumínio não é um componente fisiológico da mama, mas foi medido há pouco no tecido mamário humano com níveis superiores aos encontrados no sangue. Alguns estudos demonstraram a absorção do alumínio em aplicação tópica através dos sais de alumínio (cloridrato de alumínio, cloreto de alumínio ou complexos de alumínio-zircônio) contido nos antitranspirantes, os quais, comprovadamente, apresentam efeitos tóxicos ao organismo humano em determinadas quantidades e cumulativamente. Apesar disso, as pesquisas ainda não são conclusivas e muito menos consensuais. Mas a abordagem sobre a absorção de sais de alumínio deve continuar sendo investigada e na mira dos pesquisadores da área. Para esclarecer algumas questões sobre o uso do antitranspirante, foram convidadas a abordar o tema as dermatologistas da Unicamp Renata Magalhães, docente da Faculdade de Ciências Médicas (FCM), e Luiza Pitassi, responsável pela área de Cosmiatria. Leia a entrevista a seguir.
Portal Unicamp – Qual é a diferença entre os desodorantes e os antitranspirantes hoje vistos no mercado?
Renata – Os desodorantes são substâncias utilizadas para combater ou disfarçar o odor que acompanha as áreas de maior sudorese. Antitranspirantes são os produtos que tentam diminuir a quantidade do suor inibindo a produção ou dificultando a eliminação pelas glândulas sudoríparas.
Luiza – O desodorante possui substâncias químicas antissépticas que matam temporariamente as bactérias, como álcool ou triclosan, que são capazes de inibir o crescimento das bactérias na pele, mascarando o odor desagradável. Os antitranspirantes, além de antissépticos, possuem complexos de alumínio na composição e funcionam como inibidores da transpiração. A maioria dos antitranspirantes tem também ação desodorante, mas a maioria dos desodorantes não age como os antitranspirantes.
Portal Unicamp – O uso desses produtos tem uma faixa etária mínima?
Renata – Não se fala de uma faixa etária mínima, mas são recomendados pela época da adolescência, quando começam a aparecer os pelos, mudança do odor do suor nas axilas e diante da real necessidade. Há produtos adequados para a pele das crianças com menos risco de causar alergias. Mas até mesmo os desodorizantes sem perfume e álcool contêm substâncias químicas que podem causar irritações na pele delas.
Luiza – A Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa) determina que o uso de antitranspirantes e produtos no formato em aerossol não seja liberado para o público infantil antes dos 12 anos. A partir desta faixa etária, estes produtos podem ser utilizados, e o fabricante deve garantir que ele tenha sido dermatologicamente testado e, portanto, seja seguro para esse público. Além disso, somente na adolescência as glândulas sudoríparas apócrinas começam a funcionar, sendo estas as responsáveis pelo suor.
Portal Unicamp – O desodorante pode ser aspergido em outras partes do corpo?
Renata – Sim, desde que não cause irritação. Devem ser evitadas as regiões da face e o contato com os olhos e com a boca.
Luiza – O alumínio pode adentrar o organismo humano por inalação, ingestão ou atravessando a pele. Nesse último caso, a pele oferece grande proteção contra fatores externos, desde que esteja íntegra. O uso da lâmina para a depilação da axila pode produzir pequenos cortes ou abrasões, que se tornam vias de entrada para substâncias externas, como os compostos contendo alumínio. Um estudo recente demonstrou que ocorre absorção de alumínio, contido em compostos como o cloridrato de alumínio, mesmo pela pele íntegra, em pequena proporção na aplicação de dose única, mas o uso contínuo e prolongado de substâncias desse tipo pode levar ao acúmulo de elementos como o alumínio nos tecidos humanos.
Portal Unicamp – As pessoas podem passar o desodorante várias vezes por dia?
Renata – Sim, pode ser usado mais de uma vez ao dia, desde que não cause irritação local, pelo uso repetido. É sempre importante ter bom senso na aplicação dos produtos.
Luiza – O recomendado é aplicar o desodorante no início do dia, mas ele pode ser reaplicado antes de fazer exercícios. Recomenda-se daí o uso do desodorante antitranspirante de longa proteção.
Portal Unicamp – Qual a recomendação da Anvisa, sendo que todos os produtos referidos como antitranspirantes são classificados como de grau de risco 2?
Renata – Os produtos de risco II compreendem os saneantes domissanitários e afins que sejam cáusticos, corrosivos, os produtos cujo valor de pH seja igual ou menor que 2 e igual ou maior que 11,5, aqueles com atividade antimicrobiana (os desinfetantes e os produtos biológicos à base de microorganismos). Os produtos classificados como risco II devem atender ao disposto em legislações específicas. Significa que são produtos passíveis de registro junto à Anvisa.
Luiza – As pesquisas sobre este tema ainda são inconclusivas e não há conformidade entre os pesquisadores. Alguns estudos no momento demonstram que o alumínio contido nos antitranspirantes fica depositado no tecido mamário, mas também existem evidências de que os ativos presentes em formulações de antitranspirantes ou desodorantes não são os responsáveis pelo surgimento do câncer de mama. Portanto não existe embasamento científico para isso. A Anvisa, por meio da Gerência Geral de Cosméticos, constituiu uma subcomissão de trabalho e concluiu que, até o presente, não foram apresentados dados capazes de inferir a relação dos sais de alumínio e a incidência de câncer de mama, embora a abordagem sobre a absorção de sais de alumínio deva continuar na mira dos pesquisadores da área.
Portal Unicamp – No passado, as pessoas usavam minâncora nas axilas. Essa receitinha ainda está valendo? E o leite de rosas?
Renata – Estas práticas fazem parte do conhecimento popular. Não têm embasamento científico, mas podem ajudar algumas pessoas graças ao efeito secativo, refrescante e que disfarça o odor local.
Luiza – A minâncora tem como ativos o óxido de zinco, o cloreto de benzalcônio e a cânfora, sendo um medicamento antisséptico (ajuda a inibir a proliferação de microorganismos presentes na superfície da pele), adstringente (contrai os tecidos da pele, reduzindo as secreções) e cicatrizante. Hoje a mesma empresa que o fabrica lançou a linha de desodorantes e antitranspirantes contendo como um dos componentes o cloridróxido de alumínio, além de outros ativos na formulação. O leite de rosas também possui os princípios ativos que são o óxido de zinco e o cloreto de benzalcônio em sua formulação, além de outras substâncias antissépticas e álcool. Outro produto antigo receitado pelas avós é o leite de magnésia, que é uma mistura de hidróxido de magnésio com água, capaz de neutralizar os ácidos carboxílicos que compõem o suor e, com isso, evitar o mau cheiro das axilas.
Portal Unicamp – O que usar com o calor inesperado: só água e sabão?
Renata – A sudorese é um fenômeno fisiológico necessário para o organismo, no controle da temperatura e na excreção de certas substâncias. Com variações de temperatura ambiente é esperado que o corpo tenha sudorese em maior ou menor quantidade. Isso é difícil de evitar. Mesmo usando antitranspirante, o organismo ainda consegue achar meios de manter suas funções fisiológicas. Se existe um incômodo pelo calor, ao qual não estamos acostumados, é recomendado o óbvio: evitar lugares quentes ou a exposição solar, usar ventiladores ou ar-condicionado nos ambientes fechados, roupas leves e frescas, preferencialmente claras, que reflitam o calor. Para o banho, é recomendado a água mais morna ou fria e a aplicação de um produto de higiene de preferência da pessoa. Quando o problema é o mau odor das axilas ou do pé, associado à sudorese, a questão é outra. O odor da área que transpira mais fica desagradável devido à produção de substâncias a partir destas excretas por bactérias, que são do habitat natural desta região. Então, diminuindo a população bacteriana que ali se proliferou, pode-se melhorar o odor. Assim, sabonete antisséptico e uso de antibióticos tópicos podem ajudar a melhorar o odor desagradável.
Luiza – No verão, manter as axilas depiladas ajuda a evaporar o suor e a diminuir o odor causado pelas bactérias, cuja proliferação é favorecida pela umidade retida nos pelos. Durante o banho, é importante usar um sabonete antisséptico nas axilas. Preferir usar um desodorante/antitranspirante de marca neutra e hipoalergênico para evitar as alergias, pois o processo inflamatório causado na reação alérgica agrava a sudorese. É importante também evitar o uso dos desodorantes antitranspirantes, pois estes fazem a obstrução dos ductos das glândulas sudoríparas. Uma dica no verão é fazer compressas com chá preto, pois ajuda a diminuir o suor, devido à presença de ácido tânico – uma substância que desacelera a produção da glândula sudorípara. Existe a opção de usar os desodorantes manipulados, que são prescritos por dermatologistas e que na sua formulação possuem substâncias que não agridem o corpo.
Portal Unicamp – Como lidar com o suor excessivo?
Renata – A hiperidrose é uma situação em que a pessoa sua excessivamente na cabeça, nas mãos, nos pés, nas axilas ou mesmo no corpo todo, independentemente da temperatura ambiente, principalmente associado ao estresse. Nestes casos, algumas doenças associadas são investigadas, como obesidade, distúrbios hormonais ou emocionais, infecções, neoplasias, etc., ao passo que, nas situações sem causa definida, que são muito comuns, mesmo na infância, há opções de tratamento com substâncias manipuladas à base de cloridróxido de alumínio, toxina botulínica e até medicação oral anticolinérgica.
Luiza – Algumas pessoas possuem um quadro conhecido como hiperidrose localizada, um quadro de excesso de transpiração (em especial nas axilas) que incomoda bastante e que também pode decorrer de situações de ansiedade e nervosismo, quando o sistema nervoso estimula as glândulas sudoríparas écrinas. A hiperidrose incomoda até nos dias frios, mas é no calor que o desconforto piora. Ambientes ventilados, roupas claras (que não retêm o calor) e fabricadas com tecidos leves, que absorvem o suor, podem reduzir o desconforto. Para casos mais graves de suor excessivo, a aplicação da toxina botulínica pode ser indicada, pois bloqueia a transmissão nervosa das glândulas sudoríporas, desaparecendo o suor por aproximadamente seis a oito meses. Daí a necessidade de se procurar um especialista para investigar a origem do problema.
Portal Unicamp – Como os desodorantes mancham as roupas, eles também podem manchar a pele?
Renata – Manchas na pele podem ocorrer se há irritação primária ou alergia ao produto, o que leva à vermelhidão e outros sinais inflamatórios locais, e podem causar uma pigmentação pós-inflamatória. Eventualmente, algum produto com corantes ou outra substância química pode impregnar a pele e gerar manchas indesejáveis. Ao utilizar um antitranspirante, procure lavar a roupa o mais rápido possível, evitando que, ao guardar a roupa, o produto tenha oportunidade de penetrar nas fibras e secar demais, o que dificulta posterior remoção. Ao utilizar o produto, devem-se seguir as seguintes recomendações: secar bem as axilas, espalhar o produto uniformemente, evitar o uso de uma quantidade excessiva, esperar as axilas secarem antes de se vestir e nunca aplicar o produto diretamente na roupa. Para minimizar as manchas deixadas nas roupas, recomenda-se ainda utilizar produtos antitranspirantes específicos, que evitam o processo de manchamento, como o desodorante antitranspirante Rexona Women Crystal Aerosol ou o desodorante antitranspirante Rexona Men Invisible Aerosol.
Luiza – As manchas nas roupas são provocadas pelos sais de alumínio presentes na fórmula que podem se acumular nos tecidos e causar manchas. Algumas condições podem favorecer o aparecimento de manchas na pele, principalmente na área das axilas. Quando a pele é agredida, pode haver aumento na produção de melanina, provocando escurecimento. Em algumas mulheres, é comum surgirem manchas na pele após a depilação das axilas, pelo trauma provocado pela lâmina de barbear ou pelo uso de cremes depilatórios que causam a irritação da pele. Outro fator conhecido é a presença do álcool no desodorante, que provoca o ressecamento da pele, favorecendo o surgimento de um quadro conhecido como hipercromia pós-inflamatória. Alguns desodorantes podem causar irritação, vermelhidão, inchaço (edema), sensação de ardor, prurido (coceira), vesículas e, em casos mais graves, até bolhas no local de aplicação. Isso porque estes permanecem em contato com a pele por um longo período, favorecendo as reações alérgicas e também a sensibilização, que são causadas pelas numerosas substâncias químicas presentes nos produtos.
Portal Unicamp – Quais devem ser os cuidados ao escolher o desodorante ou outros produtos?
Renata – Se a pele é saudável e sem alergias conhecidas, a pessoa pode escolher o produto da sua preferência, tendo atenção ao prazo de validade. Deve ler as instruções de uso e a composição. Se a pele é sensível, é recomendado evitar produtos alcoólicos, detergentes, e procurar produtos em veículos mais cremosos e hipoalergênicos.
Luiza – Para ter certeza da qualidade e segurança do produto, a primeira providência a ser tomada é procurar na embalagem o número de registro da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), que é a responsável pelo registro de produtos. Alguns produtos são dermatologicamente testados ou hipoalergênicos; isto significa que foram testados sob o controle de médicos dermatologistas, o que reduz o risco de surgimento de alergia. Quando o produto não é registrado, sua composição não foi avaliada. Ele pode reunir substâncias proibidas ou de uso restrito, em condições e concentrações inadequadas ou não permitidas, o que pode acarretar sérios riscos à saúde. As pessoas que recebem o diagnóstico de dermatite de contato alérgica a alguma substância presente na formulação de desodorantes devem ficar atentas sobre a importância da leitura dos rótulos do produto, para que se evite o uso daqueles que contenham a substância que apresenta o risco de desencadear a alergia. Em caso de dúvida, consultar um dermatologista, especialista pela Sociedade Brasileira de Dermatologia. Se o consumidor encontrar irregularidades, poderá entrar em contato com a Vigilância Sanitária ou com a Anvisa.
Texto: Isabel Gardenal
Foto: Antoninho Perri e Isaías Teixeira