Rosalina Martins Nogueira, 60, nasceu no Paraná. Cresceu ajudando a mãe a cuidar da casa, enquanto o pai trabalhava na lavoura. Aos 18 anos, mudou-se para Campinas e passou a trabalhar como vendedora. Dos 10 irmãos, foi a única que contraiu Doença de Chagas. Com o passar do tempo, foi tendo dificuldade para respirar e os sinais da doença foram ficando mais intensos. O quadro de insuficiência cardíaca foi-se agravando e tempo de vida ficando mais curto.
“Passei mal no supermercado, coloquei três vezes marcapasso, tive água no pulmão… nos últimos dois anos, minha única chance era o transplante”, relatou a paciente que ficou sete meses internada em um hospital de São Paulo e depois em outro de Campinas até receber, na semana passada, um novo coração. A cirurgia foi feita no Hospital de Clínicas (HC) da Unicamp, dias antes do Dia Nacional de Alerta contra a Insuficiência Cardíaca, celebrado em 9 de julho.
O cardiologista do HC da Unicamp Otavio Rizzi Coelho Filho alerta que a insuficiência cardíaca é muito comum no Brasil e no mundo. Segundo o especialista que faz parte da equipe que acompanha os transplantes cardíacos no HC, há no Brasil em torno de 4 a 5 milhões de pacientes com insuficiência cardíaca e, no mundo, esse número é estimado em mais de 65 milhões de pessoas que tem a doença.
“As causas para a insuficiência cardíaca são diabetes, Doença de Chagas, pressão alta, infarto e outras muitas vezes desconhecidas. Quando a doença evolui para a forma terminal e os remédios não fazem efeito, se o paciente for avaliado e aprovado para receber o transplante, então essa é a única opção”, explica o cardiologista.
De acordo com o cirurgião cardiovascular Orlando Petrucci Junior que liderou a equipe do HC da Unicamp que fez o transplante de coração, o caso de Rosalina é um entre os muitos que são atendidos no hospital. Segundo o cirurgião, o HC da Unicamp já fez 104 transplantes cardíacos, mas ainda há 103 pacientes inscritos aguardando a cirurgia.
“A pandemia fez com que os possíveis números de doadores diminuíssem. Quem tem covid-19 não pode doar. O peso, a idade, a altura e a imunologia do paciente também são fatores que impactam no tempo de espera para a realização de um transplante de órgão”, explicou Orlando.
Durante o tempo em que permaneceu internada à espera de um doador compatível, Rosalina pegou covid-19. Para ela, isso foi mais difícil do que ter o “coração fraco”. Aprendeu a viver no hospital. Fez amizade com os médicos e enfermeiras. Para passar o tempo, fazia ponto cruz. Longe de casa e da família, não acreditou quando o médico disse que o coração chegou. “Era meia-noite. Liguei para minha família. Ontem que eu vi a cicatriz da cirurgia”, disse, emocionada.
O transplante não é para todo mundo e não trata todos os pacientes com insuficiência cardíaca, alertam os especialistas da Unicamp. Mas os pacientes aprovados podem se beneficiar muito do transplante, já que a taxa de mortalidade gira em torno de 80% em cinco anos para quem está esperando por um coração. Esse índice é comparável aos principais tipos de câncer em estágio avançado.
“Com o transplante, a sobrevida passa a ser de 70% em dez anos e isso muda a perspectiva do paciente. Temos paciente que depois do transplante cardíaco se casou, teve filho e fez faculdade”, revelou Otávio.
Segundo Orlando, um doador de órgãos pode ajudar até quatro pessoas. Apesar da doação acontecer num momento de dor e fragilidade para a família, talvez essa seja a maneira mais humanitária de ajudar quem está sofrendo à espera de um órgão. “A doação é um ato de bondade. Se o brasileiro doasse como na Espanha, faríamos muito mais transplantes”, disse. A Espanha é líder mundial de doadores de órgãos.
O desejo de Rosalina, assim que tiver alta, é andar no sol e cuidar de suas plantas e animais. O coração novo ela já tem. O que acontecer depois, segundo ela, não importa. Se a família do doador quiser conhecê-la, irá recebê-los com gratidão. “São duas famílias que choram, uma de um lado e outra de outro. Eu só tinha essa chance. Tem alguém diferente batendo dentro de mim”, disse.
EPTV
A história de Rosalina foi tema da primeira edição da EPTV de sábado, 16 de julho. Assista aqui a matéria que reforça a importância da doação de órgãos.
Texto: Edimilson Montalti – Assessoria de imprensa HC Unicamp
Fotografia: Edimilson Montalti e Trícia Thome – HC Unicamp